Intro

Num Domingo de Agosto, como detesto, acordo tarde e febril. Levanto-me, desequilibro-me e cambaleio de volta à cama. Recordo os sonhos da noite. De novo, sonhei com a minha praia. Todas as noites que adivinho não poder ir, lá estou. Quando tinha 16 anos sonhava com tubos em Pipeline; agora, apenas a minha praia se tornou recorrente.
Nunca a vi – mas tem um areal extenso e vegetação luxuriante, a norte. Como um morro que desce até ao mar. Algumas rochas, poucas, espalhadas pelo areal. Invariavelmente, durmo numa casa, construída na areia, com muitos quartos, onde também estão outras pessoas e alguns amigos. Usualmente, a única acção desses sonhos é levantar-me de madrugada, sair pela porta das traseiras e verificar o estado do mar. Apesar de estar sempre flat, no sonho continuo convictamente a acreditar que a minha praia acolhe boas ondulações. Simplesmente, aquele não é o dia. Outro virá.

Não sei se a minha praia existe, pois nunca a vi.
Mas hoje, na febrilidade de um domingo de manhã com ar de Outono, ocorreu-me que sim. Que neste preciso momento, gente que desconheço caminha sobre a areia. Eventualmente, gente dormirá na casa onde durmo eu. E, quem sabe, na realidade paralela à minha do agora e deste instante, aquela direita quebrará, preciosa e brilhante.
Talvez a minha praia, tão real que me acompanha, noite após noite, seja simplesmente invisível para os demais. E foi nesta conjunção que recordei “As Cidades Invisíveis”, de Italo Calvino. Naturalmente, não ambiciono comparar-me a tão ilustre autor – febre sim, mas consciência, também. Não existe aqui Imperador, figura histórica ou requintes medievais; nem obra literária ou qualquer tipo de comparação possível – nada. “As Cidades Invisíveis” foram apenas o ponto de partida, num domingo delirante e febril, para discorrer sobre todas as ondas que me permiti associar e sonhar, todas as viagens que fiz, não fiz, faço, ou farei. Porque, de alguma forma, a minha realidade, para tantos outros, não é mais que uma grande invisibilidade.


Tendo tempo, gostaria de fazer as ilustrações correspondentes a cada estória, mas tempo tem sido coisa que o tempo não me tem dado. Talvez mais tarde.


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A Sunday in August. I wake up late, as I hate, and with a fever. I get up, lose balance, and slowly totter back into bed. I recall the dreams from the night. Again, I dreamt with my beach. Every night in which I guess I cannot go, there I am. When I was 16, I would dream about tubes in Pipe; nowadays, I am only visited by my beach.
I never saw it – but it has a large shore of sand, with luxurious vegetation to the north. As a hillock that dives into the sea. Some few rocks, not many, spreaded across the white sand.
Very often, I find myself sleeping at a wooden house, built on the sand, filled with rooms where other people, and some friends, are. Usually, the only action in this dreams is getting up at dawn, get out by the backdoor and check the sea. Although it is always flat, in my dreams I go on believing that my beach can handle a good swell. Simply, that ain’t the day. Another one will come.

I don’t know if my beach exists, for I have never seen it.
But today, in the fever of a Sunday morning with an Autumn feeling, I thought it does. That, on this precise moment, people I don’t know walk across the shore. Eventually, people will sleep in the house where I commonly do so. And, who knows, in the parallel reality of this exact instant, that right will be breaking, precious and brilliant as it is.

Maybe my beach, in its reality of night companion, is just invisible for others.
And in was in this strange conjuction that I recalled Italo Calvino’s “Invisible Cities”. Naturally, I have no ambition of comparison with such a talented writer – I might have a fever, but I don’t lack conscience. Here, there is no Emperor, historical figure or medieval touch – nothing. “The Invisible Cities” were only my starting point, in a delirious hot Sunday, to ponder on all the waves I allow myself to mingle and invent, all the trips I have done, haven’t done, do, or will pursue. And because, somehow, to so many others my reality ain’t nothing but a great invisibility.


Illustrations for each story would have been great, but right now I lack the time for it. Maybe later.