Tron II
Tron foi uma maré orgásmica, que começou a mudar por volta da quinta noite quando as ondas iniciaram a sua dança rítmica crescente ao som do off shore progressivo. Acordámos de um sono mal dormido, corpos estremunhados mal amanhados, concentrados para o momento que se seguia.
Orquestrados com as nossas ferramentas e muita pica iniciámos a descida pelas águas submergentes, pranchas no frio embalar tac-tac-tac aquele som tão convidativo. A partir desse preciso instante, escuro. Os nossos olhos esvaziaram-se das órbitas e espalhando-se por todos os poros. A noite de Tron não tinha lua nem qualquer tipo de luz, apenas uma modulação suave e ritmada, pelo que passámos a ter apenas ouvidos e pele. As ondas medimo-las em rugidos, ecos, força de arrastamento e tempo de drop, uma pulsação marítima sexual embriagada e expectante.
Tron, para além dos seus famosos nocturnos, é também conhecida por ser surfada frequente da sereia de Copenhaga, que de lá escapa nas noites de swell procurando águas mais emocionantes. Foi ela que nos conduziu pelo canal escuro, estrada silenciosa no ruído explosivo de serenata húmida. Chocámos contra peixes na remada ao outside, escamas histéricas de movimento e alegria ondulatória, uma vez, e outra, e mais outra, durante todas as horas que se fizeram até ao sol rebentar no horizonte maldito, prolongando resistência de músculos e testando a indiferença ao cansaço geral.
As caves de Tron eram fundas e por mais de uma vez dentro delas estendemos o braço tentando tocar na superfície do seu tecto, sem nada. Isolados em águas giratórias chorámos e rimos em tubos outonais sem saída, águas em chamas que nos subiram pelos narizes e por lá ficaram a viver durante mais de uma semana, tempo mais que de sobra para escrever esta breve memória.
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Tron was an orgasmic tide, started to change around the fifth night as the waves began their rhythmic growing dance to the sound of the progressive off shore. We wake up from an incomplete sleep, half-awake & baked bodies, concentrated in the moment to follow.
Orchestrated with our tools and covered with stoke, then we started our path thru the submerging waters, boards in the cold tac-tac-tac lull of such an inviting sound. From that moment on, dark. Our eyes lost their orbits and senses spreaded across our bodies. Night in Tron had no light, only the gentle rhythmic melody, leading us to become nothing but ears and skin. Waves were measured in sounds, echos, dragging strength and dropping seconds, a sexual pulse of sea, drunk and expecting for more.
Besides its famous nocturnes, Tron is also known for being often the home to the Copenhagen mermaid, who escapes in the nights of good swell, searching for more exciting waters. She guided us thru the dark channel, a short paddle in the silent road among the explosive noise of the humid serenade. Colliding with fishes until the outside, hysterical scales of movement and waving joy, not only once, but twice, and many other agains and agains, for all the hours until the sun came out in the doomed horizon, begging for our muscular resistance lasting longer and testing our indifference to the general tiredness.
The caves of Tron were deep and often we would extend our arms and try to reach for the ceiling, but nothing. Alone in spinning waters we cried and laughed inside autumn tubes with no way out, burning waters going up our noses and there they have stayed for more than a week, more than enough to write this short chronicle.
The flames are licking at your feet
The sirens come to put me me out of misery
You wave your torch into my eyes
Flamethrower lover burning mind
(Incinerate, Sonic Youth)